Microcirurgia em Reprodução Humana
Dentro deste tópico, devemos incluir todos os procedimentos que empregam técnicas microcirúrgicas para restituir a fertilidade ou ultrapassar os obstáculos naturais, tanto no homem quanto na mulher.
Com essa visão podemos classificá-los em:
Procedimentos de Reconstituição
Reversão de Vasectomia
Quando um casal não quer mais ter filhos, a vasectomia é uma excelente opção. É um método contraceptivo eficaz, duradouro e de execução relativamente simples – pode ser feita em regime ambulatorial, sob anestesia local, com duração aproximada de 30 minutos, com taxas mínimas de complicações. Consiste na obstrução dos vasos deferentes, impedindo que o homem ejacule os espermatozoides. Nos últimos anos, a procura por esse procedimento sofreu um incremento graças à regulamentação pelos planos de saúde.
Entretanto, seja por separação seguida de outra união, seja por necessidade ou vontade de ter mais filhos na mesma relação, cerca de 6% dos homens procuram um médico especialista em Reprodução Humana para resolver seu problema.
Casais cuja impossibilidade de engravidar é decorrente da vasectomia têm 2 opções de tratamento: reversão da vasectomia ou fertilização in vitro com obtenção cirúrgica dos espermatozoides diretamente do epidídimo.
Realizada com sucesso, pela primeira vez, nos Estados Unidos em 1919, foi apenas em 1977, com a introdução da técnica da microcirurgia, que a reversão da vasectomia trouxe resultados realmente animadores. A técnica, empregada atualmente, exige conhecimento e treinamento em microcirurgia por parte do médico cirurgião, utilizando fios cirúrgicos muito finos, de difícil visibilização a olho nu. Durante a cirurgia, é possível avaliar o aspecto do líquido proveniente dos testículos e a presença de espermatozoides: se favorável, a chance do paciente voltar a ejacular espermatozoides após a reversão passa de 90%.
Não existe um tempo de vasectomia limite que contraindique uma reversão. Porém, é verdade que quanto maior o tempo de obstrução, menores são os índices de gravidez. Nos casos de reversão com até 10 anos de vasectomia, as taxas de gravidez chegam a mais de 70%; em indivíduos com mais de 10 anos de vasectomia, a taxa de gravidez é próxima de 44%. Atualmente, tem-se realizado esse procedimento com sucesso em pacientes com mais de 20 anos de vasectomia, com boa recuperação do potencial masculino para gravidez natural.
Entretanto, mais importante do que o tempo de vasectomia nas chances de obtenção da gravidez, é a idade e o potencial fértil da companheira. Em mulheres de até 30 anos de idade, a reversão produz cerca de 64% de gravidez; de 30 a 35 anos, 49%; a partir de 36 anos, a taxa é de 30 a 40%. Assim, é de fundamental importância a avaliação da reserva ovariana (com hormônios e ultrassonografia transvaginal) e do potencial e funcionamento tubário (através da histerossalpingografia) antes da decisão de reverter ou não a vasectomia.
Casais com dificuldades semelhantes podem ter tratamentos diferentes. Assim sendo, apenas uma avaliação pormenorizada do casal, peculiar a cada um, permite a decisão mais acertada acerca do procedimento que dará a maior chance de gravidez. Apenas o médico especialista em Reprodução Humana, após análise de cada caso, em particular, poderá oferecer a melhor proposta terapêutica.
Reversão de Laqueadura
A laqueadura tubária consiste na obstrução cirúrgica das tubas uterinas no sentido de impedir o encontro natural do óvulo com o espermatozoide e evitar a gravidez. Dessa forma, a laqueadura faz parte dos métodos contraceptivos que um casal dispõe para seu planejamento familiar. É bem indicada para mulheres que não querem ou não podem utilizar hormônios para esse fim.
Entretanto, o desejo de ter mais filho(s), na mesma ou em nova união, leva algumas mulheres com laqueadura tubária a procurarem especialistas para que as auxiliem nesse novo projeto. Assim, uma mulher com laqueadura tubária pode voltar a ser mãe por meio de 2 caminhos: reversão da laqueadura ou fertilização in vitro.
A reversão de laqueadura consiste na reconstrução microcirúrgica das tubas uterinas realizada com o auxílio de um microscópio cirúrgico e instrumentos especiais, incluindo fios cirúrgicos de difícil visibilização a olho nu. O procedimento é realizado por um especialista em microcirurgia com habilidade e treinamento necessários para a delicadeza e o sucesso da cirurgia.
O tempo da laqueadura não é fator limitante para a sua reversão, diferentemente do que ocorre com a vasectomia, situação em que um longo período de vasectomia pode reduzir as chances de sucesso de gravidez natural. As taxas de gravidez, após a reversão de laqueadura em casais com ótimo potencial reprodutivo, podem alcançar índices de 80% de sucesso. No caso da reversão da laqueadura, os principais fatores determinantes para o sucesso do tratamento são a idade e o potencial fértil da mulher (mulheres acima de 37 anos, naturalmente apresentam redução progressiva do seu potencial fértil) e, também a técnica utilizada na época da laqueadura tubária, pois a depender do local da obstrução e do comprimento de tuba uterina que foi excluída, ela pode se tornar inviável ou com pouca probabilidade de sucesso.
A decisão de se reverter deve ocorrer após uma completa avaliação do casal. Assim, a mulher fará exames hormonais, ultrassonográficos e a histerossalpingografia, enquanto o homem terá seu potencial avaliado por exames hormonais e espermograma.
Apenas o médico especialista em Reprodução Humana, após análise de cada caso, em particular, poderá oferecer a melhor proposta terapêutica.
Procedimentos de Restituição
Varicocelectomia (cirurgia de varicocele)
A varicocele é a dilatação das veias do cordão espermático, ou seja, são as varizes escrotais que elevam a temperatura testicular e podem provocar a infertilidade. Felizmente, existe tratamento para a varicocele.
O diagnóstico da varicocele é feito pelo exame físico por médico experiente. Entretanto, nem todo homem com varicocele terá dificuldades para engravidar a parceira ou necessitará de tratamento. A indicação de tratamento deverá ser feita de forma individualizada, a partir da história e exame físico, além de exame de espermograma para os adultos e de ultrassonografia de escroto para os adolescentes.
O tratamento da varicocele é a correção cirúrgica. Não há benefício comprovado com o uso de medicamentos para tratar a varicocele. A cirurgia recomendada mundialmente é aquela realizada na região subinguinal (bem baixo na virilha próxima à raiz do pênis). É uma microcirurgia e, como tal, há necessidade de uso de microscópio, realizada por microcirurgião habilitado e dotado dos instrumentos específicos. É feita com o paciente sob anestesia geral e pode durar até 2 horas. O paciente pode ter alta no mesmo dia sem a necessidade de pernoitar no hospital. Pode retornar em poucos dias às suas atividades habituais. Assim, obtêm-se os melhores resultados e os menores índices de complicações como sangramento, infecção, inchaço, atrofia testicular ou recorrência da varicocele. A taxa de sucesso com essa técnica é da ordem de 60 a 70% de melhora dos parâmetros seminais entre os primeiros 6 meses de pós-operatório.
Outros Procedimentos
Cirurgia para obtenção de espermatozoides (MESA -TESE)
Graças à modalidade de fertilização in vitro chamada ICSI (do inglês, injeção intracitoplasmática de espermatozoide) que surgiu em 1992, homens que não possuem espermatozoides no ejaculado podem ser pais genéticos pela obtenção de espermatozoides diretamente do epidídimo ou do testículo.
Existem 2 tipos distintos de situações que envolvem homens que não têm espermatozoides no ejaculado, os chamados azoospérmicos:
Os azoospérmicos obstrutivos são os que não têm espermatozoides no ejaculado por alguma obstrução, como a que acontece na vasectomia, na agenesia de ductos deferentes, em infecções. Nesses casos, existe produção de espermatozoides e eles ficam acumulados nos epidídimos, que são estruturas próximas aos testículos, onde eles amadurecem e são armazenados. Em situações como essas, está recomendado o procedimento MESA (do inglês, aspiração microcirúrgica de espermatozoides epididimários), que consiste na obtenção de espermatozoides do epidídimo a partir de uma pequena incisão no escroto com o paciente anestesiado.
Os azoospérmicos não obstrutivos são os que não têm espermatozoides no ejaculado por falta de produção, como a que acontece, por exemplo, após infecção testicular pelo vírus da caxumba, nos homens que nasceram com testículo fora da bolsa, nas causas genéticas, após quimioterapia, radioterapia, e outras. Nesses casos, o procedimento se chama TESE (do inglês, extração de espermatozoides testiculares), que pode ser feita a partir de pequenas biópsias testiculares de 2 mm cada ou a partir de uma incisão equatorial no testículo com visão microscópica que ajuda a achar locais que podem conter espermatozoides viáveis para fertilização. A chance de um homem azoospérmico não obstrutivo ter espermatozoides no testículo é ao redor de 50%.
Essas técnicas, tanto a MESA quanto a TESE, quando comparadas com as técnicas percutâneas (com introdução de agulha no epidídimo ou no testículo através da pele), conferem maior segurança e conforto ao paciente (controle de sangramento, sem dor pela anestesia), além de propiciarem maior chance de encontrar espermatozoides viáveis para serem utilizados para fertilização in vitro, ainda possibilitam o congelamento dos excedentes, evitando-se assim, novas abordagens cirúrgicas desnecessárias.
O Serviço de Reprodução Humana do Hospital São Paulo realiza todas essas cirurgias, com equipamento e recursos humanos especializados para cada caso.